
Seria a justiça, vingança? Seria a justiça, inferno? Seria a justiça, perdão? Por séculos e mais séculos o homem vive lutando pelo convívio harmonioso em sociedade, mas caindo em suas próprias armadilhas da ganância pelo poder. Numa mistura heterogênea de complexos seres formados por uma infinita variação de influências, a falibilidade tem como resultado arestas que precisam de reparo, as quais normalmente denominamos como conflitos. A evolução social levou à criação do judiciário para que, assim, pudéssemos ter, além de uma consciência tranquila, justiça. Mas será que temos?
O que seria a justiça humana? Tendências me levaram a acreditar que, mais que uma correção, a justiça é um sentimento. É a satisfatória sensação de saber que seu caso, por mais profundo e agonizante que seja, foi corrigido de acordo com os interesses humanos baseados na lei do retorno. Uma mescla de pensamento quase infantil que nos remete ao simples: errou, tem de pagar. Mas a vida, que desde seu surgimento demonstra o quão incompreensível pode ser, não resume-se a simples sentenças, redigidas no conforto de poltronas prostradas atrás de belíssimas mesas de mogno. A justiça, quando feita, pode na verdade funcionar como uma gigantesca máscara para o terror mais profundo que habita a sociedade humana. Aquele que todos nós, lúcidos senhores com acesso a educação, saúde e saneamento, lutamos com todas as forças para ignorar e fingir sua não existência: a realidade de que, mesmo o mais violento de todos os assassinos na história da humanidade, pode ser a maior vítima de todos os casos.
Sentados em nossos computadores, lendo nossos livros fantasiosos, assistindo a comédias baratas na televisão, envelhecemos como burgueses inertes, parados à sombra do que nos favorece, à margem da sorte de não termos nascido na periferia. A inércia nos leva a crer que o mundo deve girar baseado em nossos interesses, em nossas vontades, sem nos causar prejuízo. Como resultado, tornamo-nos ferramentas para a manutenção de um sistema opressor que trabalha em detrimento dos desfavorecidos em nascimento para poder favorecer a classe dominante, nós. E nessa luta desigual, onde a linha da hereditariedade já define se você terá ou não oportunidades, as maiores vítimas são esquecidas.

O ser humano, em maioria, desenvolveu uma sede por vingança. A justiça, por si só, tornou-se exatamente isso. Ladrões, assassinos, estupradores, pedófilos, todos foram execrados da sociedade, tratados como lixo e penalizados de acordo com o tamanho de seus crimes. O homem revoltou-se contra padrões de conduta baseados na razão ilógica da morte e tortura, atirando ao fogo os responsáveis. A Bíblia condenou-os ao inferno, o homem ao cárcere ou à própria morte. E na evolução desse processo, perdemo-nos, pois passamos a avaliar o desvio de comportamento como causa e não como resultado. “Aqueles que erram, merecem punição” – Mas e se o erro for consequência de nossa própria sociedade?
Gordon Northcott foi um cidadão que sequestrou, molestou, torturou e matou à machadadas diversas crianças (todas do sexo masculino). A história é contada (embora de forma muito mais suave) pelo filme “A Troca”. Na produção, vemos a dor de Christine Collins, que voltou para casa após o trabalho e descobriu que seu menino não estava mais lá. Nesse momento, sentimos a dor e a angústia como se nosso próprio filho fosse (dadas as devidas proporções) e, então, percebemos nossa sede por vingança. Torna-se uma tarefa hercúlea olhar para o rosto sorridente do fascínora posando para fotos da época e não sentir uma raiva súbita (sim, ele já estava na mídia e já sabiam que era o culpado).
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